Brilhante
Era uma sexta-feira, por volta das 17h30. Após sair do trabalho, resolvi parar num bar da região central, enquanto esperava uma pessoa com a qual precisava conversar.
No momento em que saboreava um aperitivo, um garoto me abordou com sua caixa de engraxate. Rápido, o garoto ofereceu seu serviço antes que eu pudesse recolher as pernas e esconder meus sapatos, que realmente clamavam por graxa. Preço do serviço: R$ 2,00.
Igualmente rápido, agradeci e disse que não era preciso engraxar meus sapatos. Minha resposta tentava negar o inegável: meus sapatos precisavam de graxa, muita graxa. Mas, não foi por isso que decidi autorizar o garoto a fazer o serviço, afinal, nunca liguei para sapatos que brilham.
O triste olhar do garoto, acompanhado de apelos como “por favor, tio” e “ô loco”, mudou minha opinião. Assim, ele fez o que tinha que ser feito e recebeu R$ 2,50 pelo serviço.
Serviço de qualidade? Pouco importa, nem tenho experiência para avaliar o trabalho de um engraxate, pois foi minha primeira vez. O investimento de R$ 2,50 foi recompensado quando me dei conta de que, por muito pouco, escapei de negar uma oportunidade ao garoto que apenas ofereceu um serviço. É isso, ele estava trabalhando. Não estava pedindo ou tentando levar meu dinheiro de forma ilícita.
Às vezes, com raciocínios nada brilhantes, esquecemos que temos responsabilidade na construção da sociedade, afinal, somos parte integrante dela. Muitos não conseguem entender como R$ 2,00 são importantes para esses garotos. Estamos acostumados a não conseguir comprar praticamente nada por R$ 2,00. Nos prendemos a nossa realidade e esquecemos do próximo.
Além disso, eu poderia facilmente atribuir o fato do garoto me procurar ao acaso. Mas será mesmo? Será que, através do garoto, não havia alguém testando minha sensibilidade? Certa vez, li em algum lugar: “O acaso é o pseudônimo que Deus usa quando não quer assinar suas obras”.